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Os Sapatinhos Vermelhos (The Red Shoes - Michael Powell, Emeric Pressburger, 1948)




“- Por que quer dançar?

- Por que quer viver?

- Não sei ao certo por que, mas... Preciso viver.

- A minha resposta é a mesma.”

Mais do que apenas uma película, Os Sapatinhos Vermelhos é uma carta de amor à arte, sobretudo, a dança. Ao balé e a música clássica. Traçando-se paralelo a história da bailarina, é o martírio dos mínimos detalhes (direção de arte, coreografia, fotografia e música). E com a soma destes pequenos esforços brota um belo e trágico retrato sobre o equilíbrio constante desta arte entre o júbilo e o padecimento emocional e carnal.

Logo no início vemos Victoria e Julian no teatro em perspectivas opostas. Victoria, da fidalguia, nos melhores assentos, e Julian, no setor mais modesto do teatro. Porém, a priori (a exceção do roubo de suas músicas), o encanto pela arte é o mesmo, independente da classe social. Interessante como as emoções e sensações de ambos, cada um a sua maneira, são proporcionais. Desde o primeiro “dia de trabalho” e ambos ignorados por Lermontov, a ascensão meteórica profissional.

Lermontov desde o princípio é cético e tem prejulgamentos a Victoria. Mas, a resposta de Victoria ao questionamento do porque ela quer dançar começa a romper qualquer preconceito ou ceticismo, pois, ambos, nesse exato momento, amam a dança acima de todas as coisas. O resto é trivial. A ruptura total acontece quando Lermontov assiste a Victoria dançar em teatro rudimentar em tarde cinzenta e chuvosa, cenário este díspar da convivência de ambos: Lermontov (Sucesso profissional) e Victoria (Nobreza). Porém, só com a perda da bailarina principal (matrimônio acima da dança) é que Victoria recebe a grande oportunidade. Mas, ciente que “a bailarina que confia no conforto duvidoso do amor humano... jamais será uma grande bailarina”.

As estupendas cenas do balé de Os Sapatinhos Vermelhos, por quase 20 minutos, são um deleite para a vista. As mudanças de cenários, os efeitos, em um filme de 1948, potencializam ainda mais estas virtudes que envelheceram maravilhosamente bem e que impactaram e influenciaram diversos realizadores no decurso da história como, por exemplo, Minnelli e Chazelle. O sucesso do balé supracitado simboliza a ascensão e sucesso de Victoria e Julian e o triunfo profissional perduraria até o desfecho não fosse o – inominável por Lermontov – amor. Porém, o casal não consegue “alterar a natureza humana”. Entregam-se absolutamente aos encantos do amor resultando em ódio e ciúme (explícito em O Lago dos Cisnes e festa de aniversário).


A cena da decisão de Victoria dançar ou não Os Sapatinhos Vermelhos novamente, recorda o célebre dilema do anjo e diabo nos ombros a dar conselhos, porém, com um detalhe colossal: Lermontov e Julian, ambos revelam o pior. Não há, apesar da justificação digna, zelo com a bailarina, mas motivação pessoal de sentimento de possessão (Julian: Amor ; Lermontov: Ego, transformá-la na maior bailarina de todos os tempos). O embate, obviamente, suscita um final trágico com uma homenagem (balé sem bailarina) belíssima que evidencia as contradições do filme ao belo e trágico, ao sacrifício e gozo.

Os Sapatinhos Vermelhos faz de maneira brilhante, um retrato desta arte, isto é, a magia defronte aos olhos do espectador e o suplício da equipe para que se alcance esta fascinação. A inevitável semelhança entre a história de Os Sapatinhos Vermelhos a de Victoria, extremamente verossímil, é realizada de maneira brilhante e traz aspectos mais profundos a serem ponderados servindo de analogia para a época e uma geração de mulheres que tentavam e tentam harmonizar a vida conjugal ao sonho profissional.

 
 
 

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by diogokerouac

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